¬ Lição de economia n°3: Inflação (Parte 1 - Definição e efeitos negativos)



O assunto inflação é extenso e muito conceitual. Por isso o segmentarei em 3 partes (lições), tamanha a sua  importância. Na primeira parte explicarei o que é inflação e mostrarei seus efeitos negativos. Na segunda, abordarei os tipos (fontes) de inflação (inercial, custos, lucro, demanda e choque de oferta). A terceira parte trará os índices utilizados no Brasil (IPC-A, IGP-M etc), mostrando como são calculados, sua importância e outros conceitos relevantes como aceleração/desaceleração/deflação etc. Ressalto que o entendimento desta lição depende da leitura prévia das outras 2 lições anteriores, visto que o assunto está todo encadeado.

Comecemos pelo começo. Inflação é um nome que significa elevação generalizada nos preços. E a palavra generalizada é importante, pois a elevação de um único preço não pode ser considerada inflação, salvo raras exceções. Logo, basta acompanharmos os preços dos produtos e serviços que consumimos no dia-a-dia para sabermos se eles subiram, se houve inflação. Vamos construir um exemplo prático. Imaginemos que uma pessoa ganhe R$1.000 por mês e que todo esse dinheiro seja gasto com suas compras, assim distribuídas:

  Dinheiro gasto no mês referente a cada item


PRODUTOS E SERVIÇOSR$ Gastos em janeiroR$ Gastos     em fevereiro
Feijão3032
Arroz2023
Óleo de soja106
Macarrão2520
Trigo2018
Carne8087
Ovos1012
Leite3030
Tomate1010
Alface55
Cebola56
azeite1013
Pão4043
Café2527
Papel higiênico1010
Pasta de dente1010
Absorvente2016
Sabonete1012
remédios5055
Conta de água4037
Conta de luz120125
Conta de telefone10090
Internet120120
Plano de saúde200220
Gasto total  mês1.0001.027
Inflação jan-fev-+ 2,70%


Obs1: o último grupo de preços (água, luz, telefone, planos de saúde etc) representa entre 25% e 30% de tudo que pagamos. São chamados de preços administrados, pois são controlados (administrados) direta, ou indiretamente, pelo governo.

Obs2: Uma regra básica para calcular qualquer inflação é que devemos considerar que esta pessoa (ou família) consumiu a mesma quantidade de produtos nos dois meses, do contrário o exemplo matemático não serve. Ou seja, ela consumiu (comprou) 5kg de carne em janeiro e os mesmos 5kg em fevereiro, comprou 1 pasta de dente em janeiro e 1 em fevereiro etc etc.


Essa tabela nos mostra que houve uma inflação no período, mês, de +2,7%. Notem que a pessoa gastou mais dinheiro para comprar as mesmas coisas que no mês anterior, e essa foi nossa suposição. Portanto, ela não comprou mais, apenas pagou mais caro, em média 2,7%, porque os preços subiram. Na verdade, olhando para a tabela vemos que alguns gastos subiram, outros caíram, e alguns não mudaram.  Isso fica claro no dia a dia para quem costuma levar aquela listinha de preços para comparar entre supermercados. Ali tem cada elevação, ou queda, no preço de cada produto específico.

Então, com essa elevação nos preços ela precisará não de R$1.000 pra  adquirir as mesmas coisas, mas de R$1.027. Como o salário é de R$1.000, essa família teria que retirar alguma coisa da sua cesta básica pra compensar esses R$27,00 - deixaria, por exemplo, de  tomar café, que está agora custando R$27. Quando isso acontece dizemos que o salário real diminuiu. Isto é, a pessoa continua recebendo 10 notas de R$100 como salário, que chamamos de nominal, mas a inflação corrói o poder de compra dessas notas. Logo, o salário real, o que ele realmente vale na hora de comprar, acaba diminuindo, e com isso a quantidade de produtos que pode adquirir, uma vez que as notas de R$100 não valem em fevereiro R$1.000, mas apenas R$973 (R$1.000 – R$27).

Entretanto, apenas a divulgação que a inflação subiu x% não tem valia alguma. As informações divulgadas na mídia precisam ser mais detalhadas pra fazerem algum sentido. Assim, além de divulgar o quanto ela subiu é preciso dizer qual a origem (fonte) dessa inflação (lição 4), o  índice de inflação utilizado e se houve aceleração, desaceleração ou deflação (lição 5). São esses os assuntos que abordaremos nas próximas lições, mas antes vejamos por que a inflação é preocupante, quais os seus efeitos negativos.

Salário real x salário nominal x salário bruto x salário líquido

CUIDADO: não confunda salário nominal e salário real com salário bruto e salário líquido. Salário bruto é o que vem especificado no contracheque. Já o salário líquido é aquele valor bruto menos os impostos. Não há relação alguma com a inflação aqui. Tanto o salário bruto quanto o salário líquido são salários nominais (salário bruto nominal e salário líquido nominal). Apenas no momento em que buscamos o efeito da inflação sobre esses salários nominais é que falamos em salário real, que é o salário com as perdas em função das elevações nos preços, podendo ser salário bruto real e salário líquido real.

Por exemplo, se ganho R$2.000 mas o valor que é depositado na minha conta é de apenas R1.400, o primeiro é o salário bruto, o segundo o líquido.  A diferença são os impostos, IR, INSS etc. O fato é que tanto os 2.000 quanto os 1.400 são salários nominais, pois ainda não retiramos dele a inflação, e retiramos isso por conta própria, já que esse dinheiro é perdido apenas quando vamos ao supermercado e os preços subiram. Não cabe à empresa fazer essa conta, ela se encarrega apenas de recolher os impostos e depositar nosso salário líquido.


Efeitos negativos da inflação

Sobre as famílias: queda no salário real, ou queda no poder de compra. Além disso as força a comprar à vista no início do mês e formar estoques, para que o dinheiro não se perca até o fim do mês.


Sobre as empresas: perdem porque ao comprarem seus insumos (matéria-prima, trabalho...) eles também estarão mais caros. Terão que repassar esse aumento para as famílias o que nem sempre pode ser bem aceito, até porque, como vimos, isso reduz o  salário real delas; empresas que trabalham com catálogos de venda precisariam todo mês imprimi-los novamente, o que implica custos consideráveis; força seus administradores a buscarem alternativas de investimentos que minimizem os efeitos da inflação, deslocando o dinheiro dos novos investimentos na produção para o mercado financeiro; desestimula as exportações, pois os produtos ficam mais caros também para exportar.

Sobre o Governo: O Estado é um grande comprador na economia. Como vimos na lição sobre o PIB, os gastos públicos ajudam no crescimento econômico, aumento da riqueza (PIB = C + I + G + Exp – Imp). O problema surge porque ao cobrar imposto ele não recebe à vista, e esse prazo pode variar de 1 a 3 meses. Neste caso, quando receber o dinheiro, ele já terá sido corroído pela inflação, assim como vimos acontecer com o salário dos trabalhadores. Quando for gastar (gasto público), o poder de compra de suas notinhas, arrecadação real, também terá caído.

Em resumo, como todos os agentes perdem o governo precisa tomar medidas, às vezes impopulares, para evitar que a inflação fuja ao controle.

2 comentários:

  1. pamela patriota5/10/2010

    Muito bom... Queria ter mais tempo para me dedicar a seus textos... Publica um livro!!! Parabéns mais uma vez!

    ResponderExcluir
  2. kantega5/11/2010

    Eu já tenho um publicado Pâmela.

    Mas acho que o blog me dá mais flexibilidade. O livro me deixa muito engessado. Não tenho como corrigir ou acrescentar algo.

    abraços

    ResponderExcluir