¬ Lição de economia nº17: Política cambial (Parte 2 - O preço do dólar: quem pode mais paga menos)

Por se tratar de uma mercadoria como outra qualquer, o preço do dólar também é definido por duas coisas: spread do comerciante e quantidade disponível. Nesse sentido, para cada vendedor de dólar, autorizado, podemos ter preços diferentes. Se formos a duas agências de turismo (ou casa de câmbio) em um mesmo shopping encontraremos preços diferentes, não só pelo porte e estrutura diferente de cada um, mas também pela quantidade de dólares que tenham disponíveis para vender naquele momento.

Mas o que é aquele preço divulgado na TV, nos jornais, sites etc? Aquilo é apenas uma média de preços desses diversos estabelecimentos que operam dólar; geralmente Rio e São Paulo, pela grande quantidade negociada. E esse preço divulgado na TV já nos mostra inclusive o porte dos clientes (compradores e vendedores de dólar), classificando-nos enquanto turistas ou comerciantes. Surge daí o dólar comercial e o dólar turismo, que em linhas gerais significam o seguinte:

  • Dólar turismo

Preço para aqueles que, geralmente, o compram para fazer turismo, portanto em pequenas quantidades, valores até R$10.000. Valores acima disso já precisam ser informados à receita, pois não é normal que uma pessoa física gaste mais de R$10.000 reais (convertidos em dólares), em espécie, em uma viagem de 1 mês ao exterior – salvo, claro, os “colegas” da Renascer em Cristo, por sinal, presos, nos EUA, por evasão de divisas com algo em torno de U$56.000. Para os bancos, principalmente, esses valores até 10 mil não são lá muito expressivos. Portanto vale a pena cobrar caro para compensar o pouco giro da mercadoria.

Se comprar até R$10 mil em dólares deverá apresentar apenas o CPF. Acima disso deverá fazer um cadastro de pessoa física com seus dados pessoais, permitindo à empresa que os vendeu emitir um 'boleto de câmbio', comprovando que esse dinheiro veio de  origem legal.

No entanto, para sair do pais você pode portar quantias superiores a R$10.000. Neste caso, será preciso preencher a DPV (Declaração de porte de valores). Caso queira sair com US$200 mil, além da DPV, terá que se justificar muito bem com os fiscais da receita de onde veio tanto dinheiro. Se estiver na sua declaração do IR, sem problema. Mas, convenhamos ... quem leva esse montante fez algo de errado por aqui.

Outras observações:

- a cota de entrada é de US$500, isento de impostos. Isso por via aérea. Por via marítma ou terrestre é de US$300. Lembrando que essa cota só pode ser utilizada 1 vez por mês.

- até US$10 pode trazer 20 unidades, desde que acima de 10 destas não sejam idênticas. Acima dos US$10 também são permitidas 20 un desde que não mais de 3 sejam idênticas.

- bebidas alcoólicas e charutos, por exemplo, tem limitações específicas, sendo 12 litros para a primeira e 25 unidades para a segunda.


* quem quiser obter mais informações, ou tirar dúvidas, sobre o que pode e não pode ser trazido pro Brasil indico o link: http://viagem.decaonline.com/alfandega-valores-maximos-mercadorias-permitidas/. Aqui além de informações tem um espaço, no final da página, para quem quiser perguntar algo.

  • Dólar comercial

Nome dado aos compradores de peso, e estamos falando de milhões de dólares sendo negociados de uma vez por cada cliente. Lógico que nesse caso o banco pode cobrar menos pelo dólar, pois ganha na quantidade vendida. Aqui enquadramos investidores, exportadores, importadores etc. Quem pode mais paga menos, é a regra no mercado de câmbio. Óbvio que esse preço mais baixo só é negociado em casas de câmbio e bancos, pois estes tem autorização para operar (comprar e vender) uma grande quantidade de dólares. Já agências de turismo e rede hoteleira, pelo menor volume de circulação, operam apenas com o dólar turismo, com preços mais elevados para compensar a baixa quantidade disponível e o baixo giro. Notem que isso não impede que os bancos também ofereçam esse produto, dólar turismo, com preços similares, ligeiramente superiores, aos das agências de turismo.

  • Dólar paralelo

Dólar “sem” controle algum do governo. Entra no Brasil de forma ilegal e é vendido da mesma forma, sem autorização do Banco Central. Não há também garantia de que as são notas verdadeiras. Tem um preço parecido com o turismo, mas não atende apenas a turistas, pois muita lavagem de dinheiro acontece aqui. Assim, se compro com um doleiro apenas mil dólares pago o preço do dólar turismo. Mas se estou sonegando impostos, ou trabalho com o narcotráfico, posso trocar 500.000 dólares e pagarei um preço perto do dólar comercial.

Além do narcotráfico (o traficante Juan Carlos Abadia, por exemplo, em sua luxuosa estada no Brasil, trouxe aproximadamente US$10 milhões, de barco. Outros 40 milhões, segundo ele, ainda estavam escondidos no país) e contrabando, outras fontes alimentam o mercado paralelo, como o subfaturamento das exportações.

Exemplificando: um produto é vendido por US$100,00 para um cliente no exterior, mas na fatura consta o valor de US$90,00. Assim, o cliente paga os US$100,00, mas os US$10,00 da diferença entram para o exportador de forma ilegal, sem crivo do Banco Central, e alimentam o paralelo. Já o importador pode superfaturar suas importações: compra  um produto que vale US$50,00 por US$60,00. A diferença de US$10,00 a mais que pagou fica em uma conta sua no exterior e trazidos ao Brasil posteriormente. E por que um importadores e exportadores fazem isso? Por que o dólar paralelo aqui pode estar mais alto, assim eles traz os US$10,00 de forma ilegal e os vendem aqui no mercado paralelo fazendo um bom dinheiro.

Não é à toa que toda operação da receita e da polícia federal envolvendo sonegação ou desvio de dinheiro público acaba, inevitavelmente, resultando na prisão de um doleiro. Eles são o caminho mais curto para quem precisa esconder o dinheiro fruto das operações ilegais. Como só ele vende dólar em grande quantidade sem a necessidade da identificação do comprador, acaba sendo o mais visado nas operações da receita federal. Também não é incomum nestas operações encontrarem dólares escondidos nas casas dos envolvidos, e em grande quantidade (dentro das paredes, sob o piso etc). Portanto, comprar e vender dólar, em qualquer quantidade é crime, pois é necessária uma autorização do governo. O criminoso, nesse caso, é chamado de doleiro. Óbvio que o governo não está preocupado se nós enquanto pessoas físicas compramos ou vendemos pequenas quantidades para amigos etc. Os doleiros que interessam a eles são os que movimentam grandes quantidades.

Um outro caso de boa repercussão na mídia foi o da Igreja Universal. Em 2009 o Ministério Público de São Paulo denunciou Edir Macedo e nove integrantes da Igreja Universal sob a acusação de  formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. O processo alega que o dinheiro arrecadado com fiéis seguiu para empresas de fachada no exterior e depois foi repatriado por empresas fictícias abertas em nome de dirigentes da igreja. O valor girava em torno de R$ 5 milhões por mês entre 1995 e 2001 em remessas supostamente ilegais feitas por doleiros da casa de câmbio Diskline, chegando a um total de aproximadamente R$ 400 milhões.

A cotação do dólar na mídia

Olhando do ponto de vista do vendedor de dólar (exportadores, turistas estrangeiros etc) o raciocínio é o mesmo. Exportadores conseguem um preço bom na hora de vender, pois trazem uma grande quantidade; já os turistas estrangeiros, como representam uma pequena parte dos negócios dos bancos, acabam recebendo pouco pelos dólares que trazem pra cá.

A cotação na mídia mostra isso, como vemos no exemplo abaixo.

Dólar comercial

Compra: R$1,90

Venda:   R$1,92
Spread: R$0,02

Dólar turismo

Compra: R$1,80

Venda:   R$2,10
Spread: R$0,30


No dólar comercial o preço que compramos é o preço de venda deles (R$1,92). O preço de compra que vemos na televisão é para aqueles que trazem dólares para o Brasil e os vendem aos bancos. Vemos que o ganho é de apenas 2 centavos por cada dólar. Pode parecer pouco, mas para bilhões de dólares girados no mercado cambial por dia o spread (“ganho”) é considerável.

Já no caso do turismo, como não representam o file mignon dos bancos o preço é mais caro. Assim, quem compra dólar paga R$2,10,  não R$1,92. Se por acaso eu precisar vender esses dólares, por não tê-los utilizado, para a mesma pessoa, ele me pagará apenas R$1,80. Por isso comprar dólar pra especular, enquanto pessoa física, pode ser um grande fisco. Compro caro e vendo barato. O dólar teria que subir muito para que eu ganhasse dinheiro com essa operação.

Haveria alguma possibilidade de eu, enquanto pessoa física, portanto comprando uma pequena quantidade de dólar pagasse por ele o preço do comercial, ou próximo disso? Sim! Quando utilizamos o cartão de crédito internacional para pequenas compras (importações) entramos no dólar comercial. A lógica é simples, minha compra de 200 dólares não representa nada para o mercado de câmbio, nem para a operadora, mastercard, por exemplo. Todavia, são milhares de pessoas efetuando compras todos os dias pelo cartão. A operadora, no fim do dia, compra não os meus 200 dólares, mas milhares deles para todos os clientes juntos. Pode assim negociar um preço bom com o vendedor de dólares, o banco. Por isso a fatura do cartão chega com um preço do dólar bem próximo do comercial. Mas cuidado, esse raciocínio só serve se você pagar a fatura de imediato, antes inclusive do vencimento, se preciso, pois caso o dólar suba a fatura fica “salgada” - um outro elemento que encareceu o custo das compras no exterior com cartão de crédito foi a elevação do IOF (imposto sobre operações financeiras) em 2011 pelo governo. O imposto passou de 2,38% para 6,38%. Ou seja, já vale a pena fazer algumas continhas antes da viagem pra saber se é melhor levar em espécie ou passar o cartão.

Lógico que o raciocínio do paragrafo anterior só faz sentido se o banco resolver segui-lo, até porque ele coloca o preço que quiser no dólar. Dou um exemplo pessoal. Eu tinha um cartão Credicard Mastercard, operado pelo Citibank (se não me falha a memória). Utilizei esse cartão por 20 anos e verifiquei que o valor da conversão que me cobravam na fatura era sempre de 2 ou 3 centavos, no máximo, acima do comercial - ou seja, se o comercial está a 3,20 eles me cobravam 3,23. Há pouco tempo saí desse cartão porque não aguentava mais as horas infindáveis pendurado no telefone ouvindo aquela musiquinha insuportável e as constantes quedas na ligação, pra resolver um problema simples. Resolvi pegar um cartão de crédito do meu banco (Santander). A minha surpresa na fatura foi a conversão. Eles estavam, e estão, me cobrando não 2 ou 3 centavos acima do comercial, mas acima do turismo. Ou seja, como o turismo está 15 centavos, em média, acima do comercial, eu acabo pagando 17 centavos acima deste. Para cada 100 dólares gastos eu pago R$17,00 a mais quando comparado com o cartão anterior. É o preço que eu pago pra não ouvir a tal musiquinha por horas.

Portanto caros leitores, não entrem na agência de turismo do shopping para comprar dólares e reclame que o preço deles está acima do que viu na televisão, ele mandará você comprar em outro lugar.

E onde entra o Banco Central (BACEN) nessa história? Qual a relação dele com o mercado de câmbio? Resposta na lição nº18.

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