Há um um grupo de economistas conhecidos como Supply-Siders, ou, em termos tipiniquins, economistas do lado da oferta. O tema é oportuno e merece algumas reflexões adicionais. Toda a história começa com alguns artigos publicados no Wall Street Journal na década de 1970. Seu novo editor, Robert Bartley, aderiu a uma linha de pensamento (ideológica) surgida a partir de alguns economistas e jornalistas conservadores da época, os quais não possuíam muita notoriedade no meio acadêmico. Como bem caracteriza Krugman essa corrente, em Vendendo Prosperidade: "A economia do lado da oferta foi e continua sendo um movimento de intrusos, de um pequeno grupo que nunca conseguiu respeitabilidade nem mesmo da principal corrente conservadora, exilados em seu próprio país intelectual. No entanto, esse grupo chegou a controlar, primeiro, o mais poderoso jornal de negócios do mundo, depois, a política econômica da nação mais poderosa do mundo [...] Portanto, o grupo que Bartley reuniu e promoveu era mais estranho e 'selvagem' do que um mero grupo de economistas conservadores; era mais como um culto ou uma seita do que uma escola de pensamento". Não são estes "teóricos", portanto, nem monetaristas nem keynesianos de acordo com a classificação habitual. Por que então estes "economistas" ganharam o mundo?
Tarefa não muito árdua, pois contaram tanto com a ajuda de dois economistas renomados da época, Robert Mundell e Arthur Laffer (aquele da famosa "curva de Laffer", a qual mostra uma relação inversa entre o nível de impostos e o volume da arrecadação); quanto como com a facilidade e simplicidade da aceitação de suas idéias, por mais estranhas que pudessem parecer. Assim, com o auxílio destes dois economistas, conseguiram convencer a imprensa, e os incautos de um modo geral, que o problema da oferta, ou crescimento da economia, estava assentado em um pilar diferente do tratado corriqueiramente. Enquanto uma corrente da economia denominada de keynesianos, por exemplo, diria que a oferta não cresce pela insuficiência de demanda (ou insuficiência de consumo), um Supply-Sider afirmaria, do contrário, que o entrave ao crescimento encontra-se no nível elevado dos impostos. Pequenos aumentos nos impostos podem ter efeitos negativos sobre a atividade econômica. Sendo assim, a redução destes ocasionaria um efeito inverso, estimulando a produção. Rejeitam, portanto, qualquer política que tente atuar sobre a demanda no intuito de controlar a produção, principalmente a política monetária.
Diante da simplicidade e, por conseguinte, da atratividade de tal discurso, além da nossa antiga tradição de importar tudo que venha do hemisfério norte, de produtos a ideologias, esse enfoque ideológico fincou raízes no Brasil e serve de discurso político pra um naco de empresário, políticos e economitas. Tão conservadores quanto os de lá, lutam veementemente pela redução dos impostos acreditando que isso, por si só, será o motor do nosso crescimento, que esse é o único entrave ao avanço do Brasil. Todavia, como a história serve sempre de aliada, notamos, em um passado não muito remoto, que as experiências de redução de impostos servem apenas para aumentar as margens de lucro daqueles que a defendem.
Olhando por outro prisma, o que nos assegura que a redução nos impostos fará com que haja um aumento na produção e conseqüente redução nos preços dos produtos finais? Se considerarmos que não há problemas de demanda na economia, ou seja, que ela está aquecida, nos indagamos: o que motivará um empresário a produzir mais se ele pode embolsar essa queda nos impostos, já que a demanda não se alterou? Não parece haver motivo plausível. É notório que quanto maior a carga tributária menos o setor privado investe, menos o governo arrecada em função das evasões fiscais (é o que mostra a "curva de Laffer"), e com isso menor poupança do Estado. Contudo, o que garante que com uma redução no nível de impostos a economia seja aquecida e o Estado aumente a arrecadação? Não existe nenhum indício lógico do funcionamento da "curva de Laffer" no sentido contrário - ainda que esta seja útil quando tratamos do aumento nos impostos. Apesar disso, o enfoque dos Supply-Siders não se torna menos atraente àqueles que pouco entendem de economia.
Não podemos negar que a carga tributária no Brasil é alta e que, associado a isso, temos uma grande evasão fiscal. Entretanto, talvez fosse mais profícuo tentar lembrar de uma importante variável macroeconômica denominada taxa de juros. Em se tratando de carga tributária, ainda perdemos para países como Portugal e Espanha, cujas participações no PIB são da ordem de 34,5% e 35,1% respectivamente. A diferença torna-se gritante quando comparamos a renda per capita destes países, seis vezes acima da brasileira. Portanto, achar que a redução de impostos, por si só, é a solução para os problemas da economia brasileira é um tanto quanto ingênuo.
Mas o que dizer da crise atual (2008/2009)? As reduções de IPI no setor automobilístico, linha branca, materiais de construção etc, não incrementaram as vendas e ajudaram o PIB? Sim, de fato. Isso mostra como a redução na carga tributária é importante. Mas se pensarmos bem, tal redução sem a queda na selic teria efeitos apenas no curto prazo, um paliativo que não perduraria muito. Como os desdobramentos das reduções nos juros só são sentidos no médio prazo, a alternativa de curto prazo foi favorecer alguns setores com redução nos impostos.
Ou seja, política fiscal e monetária juntas, e digo JUNTAS, tem um bom efeito na economia. Do mesmo modo, centrar o foco unicamente numa redução na carga tributária pode não ter o efeito desejado, já que o passado mostra que com economia levemente aquecida os empresários embolsam a isenção de impostos. Nesse sentido, o movimento atual de redução nos tributos não tem nada de Supply Siders, é muito mais de desespero com a crise atual, um paliativo de curto prazo; e com prazo pra acabar.
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