¬ Lição de economia n°23: Política cambial (Parte 8 – o mercado de câmbio e o Balanço de Pagamentos)


O governo mantém um controle de todas as entradas e saídas de dólares no mercado de câmbio. A partir disso tem como forçar sobras ou faltas de dólares nesse mercado, valorizando ou desvalorizando o câmbio.

À combinação dessas entradas e saídas surgem alguns nomes. Por exemplo, da diferença entre importações e exportações temos a balança comercial, cujo saldo pode resultar em um superávit comercial (exportações > importações) ou déficit comercial (importações > exportações) - não confundir isso com superávit primário ou déficit primário, pois aqui estamos falando da diferença entre arrecadação de impostos e gastos públicos.

A partir daí então o governo faz um balanço de todas as entradas e saídas, chamado Balanço (ou balança) de Pagamentos, que fica, simplificadamente, assim distribuído.


1. Balança Comercial

Exportações

Importações

2. Serviços

- Viagens (turismo)

- Pagamento/recebimento de juros da dívida externa

- Fretes e seguros pagos/recebidos

- Remessa de lucros e dividendos das multinacionais para suas matrizes ou recebimento dos lucros das empresas brasileiras que estejam no exterior

- Pagamento/recebimento de Royalties (tecnologia utilizada de outro país)

3. Transferências unilaterais

- recebimento/envio de donativos, reparações de guerra

- remessa de brasileiros residentes no exterior ou estrangeiros para seus países

- gastos com embaixadas brasileiras no exterior ou com estrangeiras no Brasil

4. Transações correntes (1 + 2 + 3)
  • é apenas uma parcial somando as 3 primeiras contas

5. Conta de capital

- Investimentos diretos (ou capital de risco) no Brasil, ou de empresas brasileiras no exterior

- Capital de curto prazo (ou capital especulativo) que entra ou sai do país

- Empréstimos e financiamentos no exterior ou concedidos ao exterior

- Amortizações da dívida externa

6. Saldo do balanço de pagamentos
  • se positivo = valorização cambial (entradas de dólares maiores que saídas)

  • se negativo = desvalorização cambial (saídas maiores que as entradas)


Observações:

* Um país pobre - que hoje chamam de em desenvolvimento, emergente, bric etc, ainda assim pobre – tende a ter a conta serviços negativa por pagarem muitos juros da dívida externa, royalties, fretes e seguros pelos fretamentos de navios estrangeiros além de muita remessa de lucro das multinacionais estrangeiras. Se essa saída de dólares é maior que a entrada na conta serviço dos países pobres, tende a ser positiva nos países mais ricos, que são os maiores credores das dívidas e onde se situam as grandes multinacionais.

* A conta transferência unilaterais geralmente não tem muito peso na maioria dos países ricos ou emergentes, ao contrário da balança comercial, portanto não são uma fonte básica de valorizações ou desvalorizações cambiais.

* A conta capital é extremamente importante, pois é como uma conta de ajuste. Se a coisa não vai bem, falta de dólares, até ali, ou seja, se o saldo de transações correntes for muito negativo, terá que ser compensado por uma forte entrada de dólares pela conta de capital, do contrário haverá desvalorização cambial e seu principal efeito negativo, elevação na inflação. Dada a sua importância, analisemos separadamente cada uma destas subcontas:

  • Investimentos diretos – são também chamados de capital de risco. Por se tratarem de investimento produtivo (novas empresas) há o risco de o negócio não dar certo – não confundir esse risco com o risco especulativo, que veremos abaixo. Estamos falando aqui dos investimentos das multinacionais, em grande parte. Alternativa para atrair novos investimentos: isenções fiscais, reduzindo o custo de produção destas novas empresas, e redução da taxa selic o que estimula o consumo de seus produtos.

  • Capital de curto prazo ou especulativo – dinheiro que se destina a um país para aplicações de curto prazo e sem fins produtivos. O exemplo mais clássico são os empréstimos feitos aos governos. Ou seja, quanto maior a taxa selic, por exemplo, mais interessados ficam os investidores ao redor do mundo em emprestar ao governo brasileiro. Falamos aqui da intervenção indireta estudada na lição 18. Alternativa para atrair novos investimentos: obviamente, elevar a taxa de juros básica e atrair especuladores. Acontece com regularidade nos países que tem excessiva preocupação com o controle da inflação oficial, como o Brasil com o IPC-A. Porém não é uma medida muito salutar uma vez que a elevação na selic aumenta nossa dívida interna e a necessidade de superávit primário para quitar os seus juros. Além disso é um dinheiro que quer ir embora o mais rápido possível, ou seja, ajuda hoje mas amanhã pode trazer problemas. Não é  à toa que as vezes o denominam hot money (dinheiro quente), ou seja, não para quieto e não produz nada.

  • Empréstimos e financiamentos – é muito comum nas grandes empresas, e na maioria das vezes mais barato, pegar dólares, euros etc emprestados lá fora. Os juros tendem a ser mais baixos o que barateia os investimentos. Quando uma empresa faz essa dívida lá fora chamamos de dívida externa, assunto da próxima lição. É um dinheiro utilizado para elevar o parque produtivo e com isso as vendas e o lucro. Assim fazem Petrobrás, Aracruz, Vale, Telemar etc etc. Mas não só as empresas fazem dívida, os bancos também a fazem, para emprestar aqui dentro a juros mais elevados, claro; além do governo. No caso do governo o destino da dívida em dólares contraída lá fora é exclusivamente incrementar as reservas cambiais. Assim, empresas, bancos e o governo são os detentores da dívida externa. Notem que o governo, via banco central, não tem controle direto sobre nenhuma das entradas e saídas de dólares no mercado de câmbio, até porque são decisões privadas. Ou seja, os dólares que entram e saem ficam nos bancos, só vão pras reservas cambias se o governo os comprar. Esse empréstimo (dívida externa) feito pelo governo diretamente com os bancos lá fora é a única conta do balanço de pagamentos onde o governo leva dinheiro diretamente pras reservas. Assim, pode incrementar as reservas pegando emprestado em dólares lá fora ou comprar os que sobram aqui dentro no mercado de  câmbio. Sabemos que a taxa de juros é o que determina o volume de dívida externa que fazemos, quanto menor melhor, e mais dívida é contraída. Veremos em outro post que essa taxa de juros depende, principalmente, do que chamamos de Risco-País, ou risco-Brasil, no nosso caso.

  • Amortização da dívida externa – por questões contábeis e de visualização essa conta entra na conta de capital e os juros entram na conta serviço. Na verdade ao utilizarmos dinheiro de outrem (dívida externa) é como se estivéssemos utilizando um serviço, por isso seu juro entra na conta serviço e o principal, a amortização, na conta de capital.

Em resumo, há formas saudáveis de estimular a sobra de dólares no mercado de câmbio (saldo positivo no Balanço de Pagamentos) e os efeitos positivos da valorização cambial (principalmente a queda na inflação) dele decorrentes como: estimular as exportações, atrair investimentos diretos (produtivos) principalmente com redução na selic e estímulo ao consumo e até dívida externa, barata, feita por empresas no exterior. A sobra de dólares decorrente da elevação na selic é uma possibilidade, mas nem de longe a mais saudável, pois só atrai capitais de curto prazo e assusta os investidores produtivos pois terão menos clientes para os seus produtos. Vejam reportagem do Jornal O Globo de 22/04/2010 sobre o assunto  (Transações do Brasil com o exterior tiveram déficit de US$12,145 bi no primeiro trimestre).

Mas e se tudo der errado? Se as exportações não forem boas, deixando a conta de transções correntes muito negativa? E se a conta de capital com seus investimentos diretos, especuladores etc não suprir essa falta? Ou seja, se faltar muito dólar e o câmbio disparar e fugir ao controle? A conta empréstimos entra em cena mais uma vez. É a derradeira opção, pedir socorro e procurar o agiota, ou seja, fazer dívida externa não com um banco qualquer, até porque eles não mais querem conceder empréstimos a quem já esteja moribundo, mas com o pior de todos os credores, cujo nome nos é bem familiar, FMI (Fundo Monetário Internacional). O empréstimo de emergência feito pelo Governo Federal vai engordar as reservas cambias e minimizar a desvalorização cambial.

Fechando o balanço temos o Saldo do Balanço. Todas as contas citadas acima tem entradas e saídas de dólares de minuto em minuto, implicando valorizações ou desvalorizações cambiais ao longo do dia. O governo faz um fechamento do balanço parcial a cada mês, para fazer um fechamento anual e um balanço das maiores entradas e saídas de dólares.

OBS: como classificamos os investimentos estrangeiros na  bolsa de valores brasileira? Capital especulativo ou investimento direto? Pode ser as duas coisas dependendo da ótica. Podemos diferenciar capital produtivo do especulativo pela ótica da aplicação do recurso. No primeiro caso o dinheiro é utilizado para um novo negócio, algo produtivo que gere emprego e renda. Enquanto o especulativo não produz nada, ou seja, irá apenas buscar uma rentabilidade fácil nos bolsos do governo. Nessa ótica a bolsa é investimento direto (capital) de risco, pois ao comprarem ações estes investidores viram sócios das empresas.

Todavia, se olharmos os investimentos pela ótica do prazo das aplicações classificariamos os especuladores como investidores de curto prazo, já que querem ganhar dinheiro e sair o mais rápido possível. Os investimentos diretos seriam de longo prazo, uma vez que novos negócios levam muito tempo pra maturar, portanto não saem logo do país. Neste caso os investimentos em bolsa seriam um capital especulativo, pois os investidores podem vender as ações que compraram imediatamente e sairem do país.

Ou seja, dependendo da ótica, os investimentos na bolsa brasileira podem ser classificados como investimento direto (produtivo) ou investimento especulativo.

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