¬ Lição de economia nº8: A Política fiscal (Parte 1 - Funcionamento)

Já comentamos que a economia é como um corpo. Precisa estar aquecido,  é sinal de que está vivo. Na economia esse aquecimento (PIB) é visível quando há uma inflação moderada. Manter esse corpo sempre em torno de 36 ou 37 graus (4,5% de inflação ao ano) é  o desafio do governo. Qualquer coisa acima disso, febre alta, é sinal de algo errado - já vimos  que temperatura muito baixa também não é bom pois a baixa temperatura deixa o corpo (PIB) lento, fraco, o que gera menos emprego. Então, esse algo errado, febre, pode ter várias causas (doenças): gripe, dengue, infecção, gastrite, câncer etc. Não basta aplicar somente antitérmicos para a febre baixar, uma vez que o problema real pode ser camuflado e a doença se agravar. Da mesma forma, um remédio para gripe não pode ser usado para infecções ou distúrbios gastrointestinais.

As 5 doenças na economia que provocam febre, inflação, já mapeamos: consumo, lucro, choque de oferta, custos e inércia. E temos 3 remédios principais (política fiscal, monetária e cambial) para combater 2 doenças específicas (inflação de custos e inflação de consumo). As políticas monetária e fiscal controlam a inflação de consumo, restringindo o poder de compra das famílias; a cambial regula o dólar e com isso a inflação de custos. As outras 3 causas da inflação (inércia, choque de oferta e lucro) têm remédios específicos: controle de preços via agências reguladoras, diminuição nas alíquotas de importações e desindexação.

Vamos ao primeiro remédio, política macroeconômica, a Política Fiscal.

O objetivo básico da política fiscal é aquele que já traçamos na primeira lição: fazer a economia crescer com o mínimo de inflação (IPC-A). Como fazer isso? Controlando o consumo. Todavia, o controle do consumo das famílias pode ser feito de duas formas: reduzindo, ou encarecendo, o crédito (isto é, diminuindo o dinheiro no bolso esquerdo, por exemplo); e reduzindo o salário (diminuindo o dinheiro no bolso direito). Se o remédio atua sobre o bolso esquerdo (crédito) chamamos de Política Monetária. Mas, se atuar sobre o bolso direito (salários ou a massa salarial) estamos na Política Fiscal.

A Política Fiscal trata da arrecadação de dinheiro pelo governo, via impostos, e da sua respectiva aplicação na economia (gasto público), como vimos na fórmula do PIB. Estas duas ferramentas, dentro da Política Fiscal, controlam o PIB (e emprego) e a inflação.

Funcionamento

Imaginemos que o governo aumente a carga tributária (impostos e contribuições), ou seja, que retire mais dinheiro do nosso bolso, reduzindo nossa capacidade de comprar (isso também pode ser feito elevando a alíquota dos impostos dos produtos/serviços). Se gastamos menos, os varejistas vendem menos e assim não conseguem elevar seus preços de venda (PREÇOS LIVRES). Ou seja, alívio na inflação. E aqui temos o velho dilema, consumo desaquecido = inflação baixa = economia desaquecida, pois as empresas produzem menos. Ou seja, PIB = C + I + G + Exp – Imp. Se o C desaquece, e representa 60% do PIB, este também desaquece, salvo se os outros elementos positivos (G + I + Exp) compensarem.

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A política fiscal atuando no controle da inflação, ao custo de um PIB mais fraco e menos empregos, é chamada de restritiva. Mas, não só com imposto ela trabalha. Há um outro remedinho que afeta diretamente o consumo das famílias, os gastos públicos. E cabe aqui uma pausa para explicá-lo. Ele envolve diversos tipos de gasto governamental: saúde (hospitais, postos de saúde...), educação (creches, escolas...), segurança, infraestrutura (saneamento, portos, aeroportos, rodovias, ferrovias, geração de energia etc), máquina administrativa (custeio da estrutura física do governo e salários, o funcionalismo público). O PAC (Programa de Aceleração no Crescimento), por exemplo, é um gasto público que tem  como base o investimento em infraestrutura. Mas continuemos o raciocínio anterior, do combate à inflação.

O governo pode optar  por elevar impostos sobre os produtos, reduzindo o poder de compra dos nossos salários (ou elevando a alíquota do IR, o que reduz o salário nominal), ou reduzir seus gastos (gastos públicos). Neste último caso teríamos menos dinheiro circulando, pois haveria menos engenheiros, pedreiros, médicos, professores, marceneiros etc etc trabalhando, já que o governo reduziu o ritmo de suas obras (creches, escolas, hospitais, rodovias etc.) - chamamos isso de massa salarial. E com consumo menor a inflação desacelera, mas o PIB paga o preço. Não nos esqueçamos de que se a inflação não vier de consumo, mas dos preços administrados, por exemplo, ainda assim o resultado sobre o IPC-A é positivo pois os preços livres são desacelerados enquanto os preços dos monopólios crescem. Não resolvemos o problema na fonte, mas corrigimos o estrago via preços livres.

Como observamos na figura acima, o que caracteriza uma política fiscal restritiva é tanto uma elevação nos impostos quanto uma redução nos gastos públicos. Se os dois atuarem de forma combinada o efeito pode ser mais forte. Vai depender do tamanho da febre e da percepção do 'médico'.

De forma contrária, se o governo quisesse estimular o consumo das famílias para elevar o PIB, basta reduzir os impostos e elevar seus gastos, injetando mais dinheiro na economia. O preço a pagar, se tal medida for exagerada, é um pouco de inflação. Temos aqui uma política fiscal expansiva.

Mas, será que a política fiscal possui somente estes dois objetivos: controlar PIB e inflação? Poderia ser desfocada e atuar em outro sentido? Sim, e é exatamente isso que veremos no próximo artigo, como o governo no Brasil a tem utilizado para encher seus cofres. É o tal do superávit fiscal, ou superávit primário.


CONSIDERAÇÕES:

* Lei de Responsabilidade fiscal: a lei da responsabilidade fiscal de 2011 é uma lei complementar à constituição federal de 1988. Veio como forma de trazer mais responsabilidade para o gestor público, bem como colocar normas (e impor limites), na gestão dos recursos (dinheiro) públicos. Como é uma lei nacional abrange a União, os Estados e os municípios. É uma forma de conduta para os gestores públicos de todo o país, e dos 3 poderes (executivo, legislativo, judiciário e ministérios públicos). Ou seja, os gestores precisam prestar contas sobre quanto, e como, os recursos foram gastos.

É uma forma de colocar regras e impor limites das receitas (em %) para os gastos com pessoal, dívida pública, renuncia de receita (isenção de impostos) etc., sendo que precisa de aprovação do poder Legislativo no final do ano. A regra básica é que o equilíbrio orçamentário seja mantido, que as metas de receitas previstas precisam ser cumpridas, além do que devem ser proporcionais às despesas que foram estipuladas ao longo do ano. Isto é, quem não cumprir as metas (Estados e Municípios) não recebe as transferências de impostos da União – lembrando que existem metas para as receitas, superávit primário, gastos, dívida pública etc.. O governante também não pode criar novas despesas sem indicar as fontes de receita, ou sem reduzir outras despesas já existentes.

      obs: impostos repassados pela União aos Estados e municípios: IRRF, IPI, Cide combustível etc. 

Basta lembrar da grande ‘briga’ entre situação (PT) e oposição (PSDB) no final de 2014 quando o governo Dilma enviou um projeto para o congresso onde alterava as regras da LDO (lei de diretrizes orçamentárias de 2014) e feria a lei da responsabilidade fiscal (veja artigo), uma vez que a meta de superávit primário de 2014 não seria cumprida (o governo havia anunciado, no começo do ano, que a meta seria de 1,9% do PIB, o que daria aproximadamente R$99 bilhões). Já a meta de superávit primário anunciada para 2015 é de 1,2% do PIB (R$66,3 bilhões)



* Carga tributária: é a soma de tudo que o governo arrecada, e que nós pagamos, dividido pelo PIB.

Ex: arrecadação anual de impostos ao longo do ano = R$30.000

PIB, riqueza gerada no ano = R$100.000

carga tributária = 30.000/100.000 = 30% (já passamos de 35%)

Logo, se a arrecadação se eleva mas o PIB cresce na mesma proporção não há elevação na carga tributária. Porém, se sobe a arrecadação para um PIB inferior é sinal que a carga tributária está mais elevada, implicando maior arrocho fiscal, política fiscal restritiva.

obs: tributos é um conceito genérico que envolve, principalmente, a soma dos impostos e das taxas cobradas pelos governos federais, estaduais e municipais. O dinheiro dos impostos implica um retorno para a sociedade na forma de obras públicas, segurança, saneamento etc, dependendo da dotação orçamentária anual feita pelo governo. Ou seja, não tenho especificamente uma destinação por indivíduo. No caso das taxas é obrigatória a prestação do serviço pelo qual a taxa é cobrada, como o pagamento do pedágio em uma estrada; é algo, portanto, mais específico.


* Impostos: temos 2 tipos de impostos

- diretos: que incidem diretamente sobre a renda ou propriedade, como: imposto de renda (IR), imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA), imposto predial territorial urbano (IPTU) etc.
- indiretos: surgem na produção ou nas vendas das mercadorias, como: imposto sobre produtos industrializados (IPI), imposto sobre a circulação de mercadorias (ICMS), programa de integração social (PIS/Cofins) etc.

Os impostos tem uma destinação estabelecida da seguinte forma: 60% para a União, 25% para os estados e 15% para os municípios. Em termos de arrecadação, os 4 impostos mais importantes são: ICMS, INSS, IR e Cofins.

3 comentários:

  1. Está muito bacana seu blog professor.Acabei caindo nele, pois estava procurando um site que venda seu livro. Enfim, tem alguma indicação onde posso achar? pq estou morando em SP.

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  2. Olá Tarcísio,

    Desculpe incomoda-lo novamente. Vi que não abordou minha dúvida nas aulas de política fiscal, e tentei procurar na internet alguma resposta, porem não obtive sucesso.

    Ontem o ministro da fazenda, Guido Mantega, anunciou a desoneração dos produtos da cesta básica como forma de tentar conter a inflação. Entendo que isso gerará uma redução direta na lista do IPCA, e com certeza ajudará a manter a inflação dentro dos limites.

    Mas essa mesma desoneração não pode gerar uma inflação de consumo? O quilo da carne 12% mais barato, por exemplo, não estimulará a população de baixa renda (já que devido ao preço salgado, não está acostumada a isso) a consumir e consequentemente gerar um aumento do preço da carne?

    Ou a inflação de consumo não é tão simples assim? Ou realmente é uma medida paliativa?

    Abs,

    Bruno

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  3. Tarcísio3/19/2013

    Oi Bruno, na verdade o raciocínio é o seguinte: se o preço da carne subiu em função da elevação nos custos, por exemplo, pode estar sobrando carne e ainda assim seus preços estariam elevados, pois os empresários os repassam. Nesse caso, se o governo reduz, indiretamente, o preço do kg de carne com a redução nos impostos, os preços dela não subirão por essa elevação no consumo simplesmente pq n faltará carne. Isso se vier de custos, se estiver faltando carne por um problema na oferta a coisa pode sim ser mais um pouco complicada. A elevação no consumo nos primeiros meses tende a forçar a inflação nos meses seguinte. Mas, de novo aqui, o governo pode estar trabalhando com a sazonalidade. Como o preço da carne está elevado hoje em função da baixa oferta, a redução nos impostos alivia a inflação até que as chuvas voltem e a oferta se regularize e dê conta da elevação no consumo que virá. Enfim, são várias as possibilidades e o governo deve estudar cada uma delas, tem até modelo matemático pra tentar prever isso. abs

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